sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Um domingo qualquer

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No próximo domingo, 05 de outubro, não vamos ao Maracanã. Mas um navegante desavisado, ao conferir as manifestações nas ruas e redes sociais, bem poderia achar que essas siglas com “P” são de times de futebol, tal o fanatismo que alguns empenham na defesa dos seus candidatos – ou, até com mais frequência, no ataque aos outros.
Embora não tenha a mínima intenção de entrar nessa, até por nenhum candidato me empolgar ao ponto de provocar esse nível de engajamento, acho até positivo que as pessoas manifestem suas preferências. Há, porém, uma série de coisas que me incomoda no modo como isso acontece em período eleitoral.
O primeiro é o já citado “futebolismo”. Não é política, estúpido, são eleições. A quase totalidade das pessoas que se manifesta nessa época não está disposta a debater sobre nada. Querem apenas falar bem dos seus candidatos e mal dos outros. Agem, assim, do mesmo modo que os políticos cujas práticas atacam: vale tudo, desde que seja pro meu preferido vencer. Porque ele é muito melhor que os outros e, com ele, agora vai.
Não descarto a possibilidade de que essas pessoas, que às vezes parecem estar babando de fúria ao discutir “política”, estejam com as melhores intenções. Que realmente acreditem no virtuosismo dos seus eleitos, e depositem neles a esperança de uma retumbante redenção para o nosso tão castigado país. No fundo, gostaria de acreditar nisso também. A vida seria bem mais fácil, eu sairia compartilhando dezenas de memes no facebook e no domingo iria todo feliz para a maquininha, apertar “xx”. Mas o realismo ingênuo, infelizmente, ainda não conseguiu me capturar ao ponto de eu ter absoluta certeza sobre nada. Assim, sou incapaz de replicar certos comportamentos e sair afirmando que quem vota no candidato “b” é idiota, quem vota no “c” só pode ser alienado ou corrupto, e coisas desse tipo. Para aqueles que vivem bem com essas certezas, vou sugerir o oposto do que certa candidata sugeriu a um comediante que se acha intelectual: não estudem. A ignorância é uma benção. Mas, se não tem a mínima ideia do que é esse tal “realismo ingênuo”, e quiserem entender um pouquinho, sugiro que iniciem por esse texto, Dysrationalia e os vieses da razão.
Passo ao largo, portanto, tanto do fanatismo como da ilusão. Não deixo de ter, claro, predileção por alguns candidatos, maior aversão por outros. Mas não enxergo, principalmente nos postulantes à Presidência com chances reais de serem eleitos, diferenças tão grandes que me façam acreditar, nem por um momento, nas profecias do apocalipse da oposição, nem no futuro brilhante prometido pelos governistas. O que acredito é que o futuro do país depende muito mais do que faremos, como sociedade, do que dos números que apertaremos na maquininha. E dessa crença decorre o principal motivo do meu incômodo com a transformação da política em Fla x Flu. 
Não se preocupem militantes, não é um incômodo nível Levy Fidélix, não acho que vocês tenham que se tratar numa ilha. Ao contrário, gostaria é que continuassem dando as caras, demonstrando essa disposição também fora do período eleitoral. E, talvez, com os ânimos menos inflamados, direcionassem a energia não só para defender um ou outro partido, mas para atuar politicamente de verdade. Discutindo ideias, e não batendo boca. Participando de associações de classe, de ONGs, até de partidos políticos, se tiverem estômago. Fiscalizando a atuação dos políticos que elegemos. Acompanhando as contas públicas. Combatendo a corrupção e os maus hábitos no cotidiano, em vez de apenas compartilhar denúncias de “escândalos”. Abraçando bandeiras universais, como os direitos humanos, o combate à intolerância e ao preconceito. Enfim, fazendo qualquer coisa que tenha a mínima probabilidade de ser construtiva. Até escrever num blog vale. :)
Sinceramente, desejo que isso aconteça muito mais do que “torço” pela vitória de qualquer candidato. Mas, como caí na besteira de escolher a pílula vermelha, sei que não é assim que vai ser. Até domingo, e depois, havendo segundo turno, as pessoas continuarão enxergando anjos e demônios. Pouco depois, irão tomar conta das próprias vidas, até as próximas eleições, quando elegerão novos salvadores da pátria.
Pois, para mim, esse domingo não será muito diferente de qualquer outro. Sim, o que for decidido no domingo valerá pelos próximos quatro anos. Mas não importam os nomes que saiam daquelas urnas, não é neles que está o poder de transformar o país e melhorar as nossas vidas. Só nós podemos fazer isso. Mas dá muito trabalho, então, é melhor ficarmos brigando uns com os outros a cada quatro anos.


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